Ich schaff's nicht ohne dich

Olhando-me no espelho agora, percebo. Eu não era assim – a pele de meu rosto antes não tinha esse tom, tão sem graça, e não haviam tantas espinhas. Não haviam essas rugas, marcas do envelhecimento precoce devido à carga que carrego, talvez. Meus olhos não eram assim tão mortos, na verdade, eles emanavam vida. Hoje, nem o delineador, que até certo momento foi meu aliado, consegue esconder a perda da vida que se esvai aos poucos de minha essência. Meus cabelos não eram assim tão opacos, já foram de despertar inveja, um dia. Hoje, por mais que as pessoas digam o quanto ele está bonito, sei que já o vi em dias bem melhores. Minhas mãos não eram assim tão ásperas. Um dia, já foram mais macias, mas agora estão grossas, ossudas e rígidas. Minhas unhas já quase não existem. Minha voz e risada não eram assim, tão apagadas. Minha boca não era assim tão seca. Meus pés e minha coluna não eram assim tão doloridos. Não, minha coluna realmente não era assim tão dolorida. E o que mais me entristece é saber que eu realmente estou murchando. Já não sou mais como fui, não sinto mais como senti. E o que pulsa, aqui dentro, já não é mais tão cheio de vida quanto um dia foi. Isso está me matando. Essa esperança que não acaba, por mais que tudo aponte que não dará certo. Está sugando-me aos poucos, me tirando a vida, meu auto consolo, meu conformismo... Bitte, rette mich.


Na manhã de algum dia de 2004 ou 2005.

Eu e minhas três melhores - e unicas (nova regra gramatical?) naquela época - amigas estávamos escondidas, dentro de um túnel de plástico em forma de serpente, daqueles que as crianças passam por dentro.
L: - Ei, vocês sabiam que a Ana perdeu a virgindade?
(todas): - Sério? Nossa!
Eu: - Ahm, o que é virgindade?
L: - Não acredito que você não sabe o que é virgindade!
Eu: - Claro que eu sei! Só que faz tanto tempo que eu não falo no assunto que esqueci.

Ainda me surpreendo com a minha inocência em relação à certas coisas, mesmo hoje. (risos)
Ahn, e com a minha capacidade de dar desculpas esfarrapadas também.

Laboratório 1800s.

Hoje, fui colher sangue.
Minha mãe já estava ficando cansada com essa situação, uma vez que ela estava tentando me levar para fazer exame de sangue desde a semana passada, mas eu sempre tinha uma desculpa para não ir. Um dia foi por que adoeci. E o outro, também adoeci. Não eram desculpas esfarrapadas e sim verdadeiras, mas já estavam tirando a minha velha do sério.
Hoje, eu fui lá. Assim que entrei no consultório, fiquei apaixonada.

Você já foi num consultório em modelo colonial?
Todo na madeira, com muitas plantas. Com aqueles sofás de madeira com assento fofinho.
Muito lindo.
Só teve uma coisa, que me deixou incomodada.
Um armário de ferro, pintado de vermelho, que não combinava nada com o clima do lugar.
E se não bastasse o armário, ainda tiraram quatro frasquinhos de sangue. Quatro.

Manaus, 20:48 hrs 25/01/11.

Uma felicidade toma conta do meu insignificante ser.

Acho que é efeito dos remédios.

Um Final de Semana em Janeiro.

Escrito no papel, no sábado, dia 22 de janeiro de 2011.

Na noite de sexta-feira, sua mãe te mandou lavar a louça. Enquanto o fazia, começou a espirrar, sinal de duas coisas: ou rinite alérgica, ou gripe.
Você optou pela primeira, se fosse, logo passaria, depois de uma boa noite de sono, mesmo sabendo no que dia seguinte, provavelmente sua cabeça doeria. Mas então chega a notícia que na manhã do dia seguinte, você irá para o sítio. "Que sítio?" Você pensa. Você não lembra de nenhum sítio, mas então, logo liga o sítio à ilha. A Ilha, dos seus avós. Logo você pensa em acordar cinco horas da madrugada, pegar o barco às seis e enfrentar quatro horas, Rio Solimões acima. (ou abaixo, tanto faz)
Você se desamina. Não que não queira ir. Claro que, em condições normais você aguentaria. Mas estando meio ruim, e sabendo o quanto o duro interior amazonense exige das pessoas sedentárias, já presume as dores do dia seguinte.
Dorme cedo. E se espanta, ao acordar. Já eram seis e pouco, você e sua família já deveriam estar no barco. Mas então sua mãe lhe diz que vocês estão indo para o sítio, o sítio do esposo de sua prima. "Ah, menos mal." você pensa.
Toma seu café, vai até a casa deles. Família grande, animada, como a sua.
Todos no carro, pé na estrada. (ou rodas na estrada, tanto faz +1)
No carro, seu pai te deu um saquinho com castanhas de caju.
Enquanto come, lê Memórias de uma Gueixa. Janela fechada.
Olha para o lado e observa, a euforia de seus irmãos, pegando vento à 120 km/h na cara. Então, você pensa "Ahn, que se dane."
Você ficha seu livro, abre a janela. Aquele vento forte bagunça seus cabelos, e você brinca, fazendo sua mão dançar ao vento do lado de fora da janela. Observa a estrada, as florestas, os pequenos lagos nela. Aquele fresco vento, com aquela clara luz e aquele calor aconchegante do sol. Sua cabeça não dói quase nada, você está bem.
Quando percebe, a viagem chega ao fim. Você chegou no sítio.
Sai do carro, caminha pela terra.
Olha para cima, e vê um monte de cupuaçus, logo acima da sua cabeça.
Você entra na casa. Pequena, humilde, de madeira. Mas de um aconchegante inexplicável. O pai do esposo da sua prima os recebe, com um sorriso simples no rosto.
Você arruma suas coisas, em um dos cômodos da casa.
Sai. Todos saem. Todos vão descendo da casa e começam a seguir uma trilha, no meio da floresta. Você anda, anda, anda. E quando olha, lá embaixo há um pequeno lago, de águas claras e limpas. Lá embaixo, sua prima senta, na cadeira, põe o bebê para mamar, e observa. Todos pegam suas varas de pescar, e seguem em frente.
Você nunca pescou antes na vida, então logo no início se enrola um pouco com o anzol. Silêncio.
De repente, gritos. Seu pai pescou um peixe. Todos se empolgam, em seus elogios.
Você logo se questiona, se a pescaria não exigiria silêncio. Enfim, não liga.
Você se isola, vai para o sol. Odeia pegar sol, mas estava empolgada com a pescaria.
Você fica em cima de um tronco grosso, de árvore. Deveria ser uma árvore bem alta, pela grossura do tronco. Silêncio. Então, um peixe morde a sua isca. Ele seria o único.
De repente, mais gritos. Seu pai estava pescando mais que qualquer um. Sua mãe tentava, e pescava mais alguns, poucos. Seu irmão e irmã, sentados, do outro lado do lago, rindo alto também pescavam um peixe ou outro. Seus primos brincavam com os walktalkers do esposo da sua prima que é policial. Todos aparentavam estar felizes. Você se sentia bem, apesar de sentir o sol de onze e meia queimar sua pele um pouco desprovida de melanina.
No terminar da pesca, você já sentia os efeitos do sol na sua pele, e já estava sentada na sombra, segurando o bebê de sua prima, enquanto ela relaxava um pouco. Você sobe de novo a trilha. Percebe mais do que nunca os efeitos do seu sedentarismo. Chegou quase sem fôlego lá em cima. Sua cabeça, agora dói bastante.
Tontura.
Você entra em casa e senta-se um pouco, na cadeira de balanço daquele senhor, dono do sítio. Ele liga a TV, e você começa a assistir um filme de quando Nicolas Cage ainda era novinho. Você volta a espirrar.
Sua pele, agora já está quente e vermelha. Seu nariz, também está vermelho - não do sol, mas da suposta gripe ou rinite. Enquanto estão preparando o almoço, você embala o bebê na rede, enquanto ela dorme. Você joga damas com a sua irmã e a derrota.
Você almoça e senta-se novamente na cadeira, assiste o resto do filme.
Todos estão lá fora, menos sua prima, que está na rede, dando de mamar ao bebê, que dorme em seu seio enquanto canta Close To You, The Carpenters, num tom unicamente dela. Essa música te lembra sua mãe. Seu pai, como sempre, não fica quieto. Ele está mexendo no velho engenho de moer cana, para fazer garapa. Você cochila.
Então, lá no fundo, no seu sono, ouve gritos. Seu nome.
Em seguida, um grito de dor. Olha pela janela. Em seguida, risos.
Seu irmão. Havia caído um cacho de pupunha nos ombros dele.
Uma voz grita seu nome novamente. Agora, você reconhece.
É seu pai, com um copo de garapa gelada para você.
Faz muito tempo que você não toma, mas aceita o desafio e dá o primeiro gole.
O gosto é simplesmente espetacular. Uma delícia.
Você toma tudo, e se senta ao lado do bebê, que agora dorme sozinho na rede ao lado. Seu nariz, agora está escorrendo. Você fecha os olhos.
Gritos de criança brincando, gargalhadas altas, conversas.

Existe algo mágico em saber que sua família está sorrindo, feliz, por mais que você, em sua doença, não esteja lá com elas.

Já chega.


Tem uma hora que você abre seus olhos, sente e sabe que a hora já chegou, talvez já até passou. Hora de morrer de um jeito, e acordar de outro. Outra vida. Não digo isso de forma espírita - uma vez que não sou espírita - mas digo isso me referindo à mudanças. Mudança de vida.
O que te assusta um pouco, por que até ontem você era uma moleca, com tantos sonhos à serem perseguidos, tantos ideais. E um dia você acorda, e percebe que não é mais uma criança. 17 anos. Para muita gente isso ainda é ser criança, mas você sabe que não. Sabe que já chega da vida que levou até agora, das pessoas que te machucaram, dos amores não correspondidos, das unhas roídas pela incerteza, dos sapatos desgastados, da alma cansada. Das pessoas que só fizeram te arrastar para trás. Sabe que já chegou o tempo de parar de deixar qualquer um te pisar, parar de ouvir qualquer comentário ruim sobre você e aceitar. Chegou a hora de tomar uma atitude, de ser mais você, diria eu.
Então uma nova fase se inicia, você sabe que é a hora de seguir em frente, garantir o seu espaço, e estar perto de pessoas que se importem.
Mas quem sabe o que a maré pode te trazer, as coisas e pessoas que cruzarão o seu caminho. Novos passos, novos ares.

Não vou mudar. Continuarei sendo a mesma pessoa. Mas dessa vez, com um novo sorriso. Serei alguém mais feliz, mais completa.